Hoje publicamos três poemas inéditos de Matheus Guménin Barreto (1992, Cuiabá), poeta, tradutor e doutorando na Universidade de São Paulo e na Universidade de Leipzig. É autor de A máquina de carregar nadas (7Letras, 2017) e Poemas em torno do chão & Primeiros poemas (Carlini & Caniato, 2018). Lança livro novo neste ano.


Patina patina em círculos no gelo
patina no gelo
e caem Tomahawk sobre o sono morno da Síria
sobre o solo frio da Ucrânia cai
o general iraniano cai
patina patina no gelo
caem na carne morna dos arariboia as balas as as
patina
patina patina no gelo patina em círculos em círculos
os pés como os do enforcado os pés
patina enquanto caem as pedras sobre a adúltera

Patina patina em círculos no gelo
veste os sapatos, paga 6,30 euros, dorme tranquilo.


A mão que arde no arbusto
é a mesma
que arde no sexo do amado é a mesma
que arde na areia e na espuma
a mão que arde no sexo do amado
é a mesma que faz a cama com vagar
entre paredes altas
mais alto o ardor branco da cama feita, apaziguada.
A mão que arde no branco da cama
é a mesma que limpa fezes e a mesma posta contra a luz de relâmpagos
à noite
a mesma que abre o pão é a mão a mesma.

Em cada coisa o vagar, em cada coisa o furor mudo.


Descasca das mãos o tempo
(cai mudo azul-escuro),
esfarelado o tempo do que foi e já nem mais
tenta. Descascam dos olhos umas tardes vermelhas
de maio. Descasca da boca um quase beijo
adiado e já não dado
mais. Descasca do corpo o corpo,
rastro sujo do que era, promessa
só feita.