O Nome da Rosa é um livro atraente por se tratar de um romance policial ambientado na Idade Média europeia, envolvendo manuscritos apócrifos e a inquisição. Seu appeal aumenta se nos lembrarmos que foi o livro responsável por tirar Umberto Eco da obscuridade e transformá-lo em um dos mais conhecidos e respeitados escritores italianos da contemporaneidade – talvez tanto que esteja inscrito na lista de proscritos do prêmio Nobel. Sem contar o filme, com o ex-James Bond Sean Connery no papel principal.

Mas isso tudo se pode descobrir só lendo a orelha do livro. Ou seja, é superficial demais. As verdadeiras qualidades do livro estão escondidas lá dentro. Algumas de modo facilmente identificável, outras de modo mais sutil – como convém ao filósofo e especialista em semiótica que Eco é.

A história se passa em uma abadia beneditina nos Apeninos Setentrionais, no século XIV – mais especificamente no inverno de 1327.  Nessa abadia – famosa por sua gigantesca biblioteca, que possuía normas bastante restritas de visitação – o monge franciscano Guilherme de Baskerville e seu noviço Adso de Melk devem organizar uma reunião entre emissários do papa João XXII e monges franciscanos, para a discussão sobre a heresia – ou não – de uma ramificação franciscana que prega a pobreza apostólica – o que implicaria em uma condenação da riqueza do papa e dos bispos.

Até aí já temos uma ambientação rica e uma tensão considerável. A coisa explode quando começam a acontecer uma série de mortes, bastante suspeitas, que os beneditinos – liderados pelo velho bibliotecário cego Jorge de Borges – identificam com algumas passagens bíblicas do livro do Apocalipse. Referências refutadas por Guilherme e Adso, que resolvem investigar por conta – o que fazem utilizando um método hipotético-dedutivo, em contraste com a instintividade e fanatismo dos outros religiosos.

Alguns provavelmente já identificaram algumas das referencias dos personagens. Guilherme de Baskerville recebeu o ‘Baskerville’ em uma referencia à obra de Arthur Conan Doyle, criador de Sherlock Holmes – que é metade da inspiração de Eco para a personagem. A outra metade é Gulherme de Ockham, filósofo nominalista, um dos mais importantes da idade média e responsável por cunhar o princípio que ficou conhecido como ‘lâmina de Ockham’, em que diz que se um fenômeno pode ter múltiplas explicações, a mais simples é a mais provável.

Se Gulherme é, ao menos em parte, Sherlock Holmes, a sonoridade do nome Adso não é despropositada: deve lembrar o leitor de Watson, também da obra de Doyle. Além disso seu nome também é o de um abade francês que, no ano de 920, escreveu uma biografia do anticristo.

Jorge de Borges talvez seja a referencia mais explícita: um bibliotecário cego encarregado de uma gigantesca e hermética biblioteca só pode ser uma referencia ao escritor argentino Jorge Luís Borges.

E isso é só o começo. À medida que a história vai se tornando mais complexa – Guilherme e Adso indo cada vez mais fundo no mistério dos assassinatos, o legado papal chega, acompanhado do inquisitor Bernardo Gui, que parece ter algum passado comum com Baskerville – aumenta a paranoia e a quantidade de referências as que o leitor é submetido.

O Nome da Rosa  é um livro típico de Umberto Eco. O que quer dizer que é um romance riquíssimo, ao mesmo tempo cerebral e engraçado. Seu ritmo não é tão veloz quanto o do filme, mas não decepciona – isso serve para engrandecer a história e os raciocínios por trás da trama.

O Nome da Rosa

de Umberto Eco, tradução de Aurora Fornoni Bernardini e Homero Freitas de Andrade

546 páginas

R$ 59,90

Saiba mais sobre essa e outras obras no site do Grupo Editorial Record