No dia primeiro de janeiro de 2012, entrou em vigor a nova constituição da Hungria. Vendida pelo governo conservador como a fase final para o país se afastar daquilo que foi a República Popular da Hungria. Ao que tudo indica, porém, o governo radicalmente conservador de Viktor Orbán afastou-se para o outro extremo do espectro político, perigosamente perto de uma extrema direita totalitária. Apesar dos protestos contra o atual governante, na última semana aconteceram protestos em seu favor de tamanho comparável aos primeiros.

Mas Orbán e seus fiéis manifestantes não são os únicos que apresentam perigos potenciais. Na verdade, os mais cruéis, conservadores e totalitaristas cidadãos húngaros são escritores e críticos literários.

Os críticos magiares dividem sua literatura nacional em duas frentes: a verdadeira literatura nacional e a má literatura. Por verdadeira literatura nacional entendem-se todos os escritores ufanistas, que ou consideram o país como o paraíso terreno ou pregam a superioridade da nação e seus valores ante a tudo. Por exclusão, todos que não o fazem são maus escritores.

Cito aqui alguns dos maus escritores húngaros: György Spiró, György Konrád, Péter Esterházy, László Krasznahorkai, Péter Nádas e Imre Kertész. Pelo menos Esterházy e Kertész já devem ser mais ou menos conhecidos do público brasileiro. Os outros são nomes que, mundo afora, são ao menos igualmente importantes. Ákós Kertész, além de desgraçado pela crítica, perdeu, honorariamente, sua cidadania.*

A crítica literária húngara encontra-se em uma posição bastante perigosa: tornou-se, antes de mais nada, política. É evidente que alguns de seus eleitos são realmente bons escritores. Não conheço a maioria, mas posso dizer que ao menos Szilárd Rubin merece o crédito que tem.

Zsolt Bayer, no entanto, não. Jornalista de profissão, ao que tudo indica é ainda pior prosador que nosso roedor mágico.  Não só é a menina dos olhos de Orbán, mas da ala mais radical da crítica literária húngara. Tudo, aparentemente, por conta de declarações um tanto agressivas a respeito de Nádas e Irme Kertész – acusando-os, entre outras coisas, de não poderem ser húngaros por serem judeus.

A Rússia e a Bulgária parecem estar em situações semelhantes – a intelligentsia parece se dividir entre bons e maus sujeitos, sendo julgados por sua postura política em detrimento de sua produção. Ambos os países, aliás, parecem estar com problemas em suas democracias – problemas eleitorais, xenofobia e outras coisinhas anti-modernas.

* Na verdade, perdeu sua cidadania honorária. É uma coisa meio confusa, já que ele é cidadão húngaro e não o deixou realmente de ser.