Mais uma vez, Henry Chinaski. O poeta beberrão, encrenqueiro e problemático. Que, é verdade, esconde dentro de si um homem sensível – pelo menos muito mais sensível que a maioria das pessoas que vive ao seu redor. Mas não apenas Chinasky: na verdade ele não aparece na maioria dos contos de A mulher mais bonita da cidade, excelente lançamento da coleção 64 Páginas da editora L&PM. Todos os outros protagonistas, porém, parecem com ele. E com Bukowski (ou a imagem de si mesmo que ele imprimiu na imaginação de seus leitores).

Como o nome da coleção já aponta, são 64 páginas apenas. Espaço para sete contos de um dos poucos escritores estado-unidenses que realmente chama minha atenção.  Como era de se esperar pelo nome que assina os contos, há muita bebida, sexo, literatura e tristeza.

O conto que empresta seu nome a essa pequena coletânea já emprestou seu enredo ao filme Crônica de um amor louco, do italiano Marco Ferreri. O narrador – que não é identificado, mas que tendo a relacionar com Chinaski por força do hábito – nos conta a triste história de seu relacionamento com Cass: meio branca e meio índia, passou um tempo em um convento, antes de cair na vida. E daí pra baixo. O estilo bruto de Bukowski, com seu vocabulário nada refinado, mas ainda assim poético, deixa a coisa toda ainda mais melancólica.

As histórias que se seguem centram-se em homens. Em “Kid foguete no matadouro” um ex-campeão de boxe tenta um emprego num matadouro, depois do fim de sua carreira. As duas histórias seguintes, “Na cela do inimigo público número um” e “Cenas da penitenciária”, parecem interligadas: na primeira um homem chamado Charles Bukowski vai preso e, na seguinte, temos algumas reminiscências de um prisioneiro. Em todas as três prevalece um humor corrosivo, auto-orientado.

Já em “O assassinato de Ramón Vasquez” a tônica é totalmente diversa: um velho ator homossexual recebe visitas em sua casa. Dois jovens irmãos, cheios de sonhos e aspirações quanto a Hollywood. O resultado é, de uma só vez, óbvio e surpreendente. Faz rir da morte e, quiçá, lamentar a vida.

Eis que, no penúltimo conto, surge Chinaski: “Você aconselharia alguém a ser escritor?” é o título do conto e a pergunta que o alter ego do velho Buk precisa responder. Entre, é claro, bebidas, mulheres e leituras de poesia para as quais é arrastado de má vontade.

E o livro fecha com “Vulva, Kant e uma casa feliz”. O título do conto é repetido como um mantra durante toda a história em que Jack passa o seu dia apostando em cavalos e refletindo sobre a vida.

Um livro curto, mas excelente. Ainda mais se pensarmos, dentro de uma lógica um pouco bukowskiana, que custa pouco mais que uma carteira de cigarros (ou a mesma coisa, dependendo da marca).

A mulher mais linda da cidade

De Charles Bukowski.

Tradução de Milton Persson.

64 páginas.

R$ 5,50.

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